Durante aquela longa madrugada o galo
finalmente cantara. Trazia consigo uma nostalgia embebida de sentimentos
ásperos e gélidos de uma triste solidão. Lá no canto, isolado, podia-se notar
um homem choroso como uma criança que inconsoladamente e desesperadamente quer
algo que não pode ter. Chorava e chorava e chorava o remorso de descobrir que
tudo foi uma farsa, que havia sido enganado, entretanto algo ainda pior do que
os sentimentos de deslealdade lhe tomavam o peito: a agonia de saber que havia
sido enganado por si mesmo, pelo seu coração traidor.
No peito uma dor insistentemente
irremediável. A cabeça a mil já não mais conseguia pensar em nada relevante e
ainda carregava o fardo de saber que aquilo tudo ainda não pararia por ali,
aquela longa madrugada em aceso se prolongaria numa dolorosa manhã em que mundo
jamais esqueceria.
Pedro via-se contrariado por si
mesmo, numa mistura de remorso e arrependimento: “O Mestre previu que eu o
negaria e ainda sim não me odiou, como isto é possível?”. Os pensamentos de
quem andou 3 anos com o Eterno encarnado e continuava sem conhecê-lo eram
intensos, e Pedro notou que eram verdadeiros. Ainda sim, a pior tortura de
todas foi imaginar que não mais conversaria com Ele, mesmo o Mestre tendo
avisado que voltaria, e assistir a toda aquela dor de camarote. Com as mãos
atadas aquele pescador grosseirão via-se completamente impotente.
Após alguns dias o velho homem
deprimido decidira voltar a pescar. Mas por quê? Há tanto tempo ele havia
largado aquela prática, deixado para trás os afazeres do velho homem para
finalmente ser alguém novo. Finalmente começara a perceber que não era tão
diferente quanto pensava, finalmente deixara de acreditar no seu coração.
Alguns discípulos se compadecendo da
dor do companheiro embarcaram juntos, e passaram aquela noite frustrante sem um
único peixinho até que um homem encapuzado chega e manda que lancem a rede do
lado direito. Sem reconhecê-lo, os teimosos pescadores começaram a murmurar e
dizer o quão ruim a noite havia sido, mas que mal há em apenas mais uma
tentativa? Lançaram a rede e não conseguiram puxá-la de volta, 153 peixes foi o
prêmio total pela obediência naquela ocasião.
Reconheceram o Mestre todos que ali
estavam, mas não Pedro. Pedro enxergava muito mais do que apenas o Mestre em carne
e osso e Espírito, enxergava redenção para todo aquele acúmulo de dor
silencioso, uma oportunidade de extravasar e colocar tudo para fora. Pedro
enxergava arrependimento em si mesmo, finalmente percebera que todos aqueles
anos seguindo a Jesus não o fizera conhecer tanto quanto o fato de tê-lo negado
e se arrependido, começara a compreender que a graça de Cristo significa o tal
do “favor imerecido”.
Com seu coração ardente, mais do que
qualquer outra pessoa no mundo, Pedro coloca sua roupa e não aguenta de tanta
felicidade e ansiedade para conversar com Jesus, se atira ao mar antes mesmo
que o barco atracasse na costa e corre loucamente ao seu encontro. Jesus o
esperava com alguns pães e peixes, e Pedro finalmente percebera que o
Eterno vem ao nosso encontro onde nós estivermos, ainda que com as práticas do
antigo homem novamente, nos resgata de toda a dor e solidão, e ainda prepara um
banquete.
Então feliz, Pedro percebe que Jesus
o havia encontrado, não o contrário.
Assim acontece com muitos até hoje, percebem
que Deus é quem nos encontra e nos resgata.
As vezes esquecemos que Cristo sempre esta de braços aberto pronto para nós perdoa.
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